sábado, 10 de outubro de 2009

O amor nos tempos do Gabo.

Difícil escolher qual livro comentar, depois do primeiríssimo Dom Casmurro. Mas esse lugar de honra vai para aquele que considero um dos melhores, se não o melhor escritor da atualidade: Gabriel Garcia Marquez, Prêmio Nobel de 1982. O livro, O amor nos tempos do cólera.

Falar de O amor nos tempos do cólera intimida, pois nada que se diga traduz a real experiência de lê-lo. Se fosse resumir numa frase, diria que é um romance para ser lido pausadamente, sorvendo cada palavra como quem saboreia uma taça de vinho. Não apenas a história é maravilhosa, emocionante, encantadora, quanto o estilo do Gabo é único. Nele, tudo se encaixa em tudo, nada sobra, nada falta e qualquer diálogo parece lapidado.
Nesse livro, que li duas vezes (e acho pouco), tudo acontece na medida certa: poesia, romance, narrativa, drama, fantasia, realismo, sempre com uma pitada do humor sarcástico característico do autor.
Segundo García Marquez, este é o seu melhor romance, superando Cem anos de solidão, que conquistou gerações de leitores. Ele teria dito ainda que foi escrito "com as entranhas”. E é assim que esse romance chega ao leitor: arrebatador.
Inspirado na história de amor vivida por seus pais, Gabriel e Luíza, tem como tema o romance de Florentino Ariza e Fermina Daza, que demora mais de meio século para se concretizar. Apaixonado pelas tranças de Fermina, o jovem Florentino passa a enviar-lhe cartas apaixonadas, mas o romance é frustrado pela oposição do pai da moça, que a envia para uma temporada no interior. Ao retornar, atendendo à vontade paterna, Fermina casa-se com o médico Juvenal Urbino, que chegara para combater a epidemia do cólera na cidade.
O casamento dura 50 anos, até a morte do doutor (um dos melhores capítulos do livro). O amor de Florentino, porém, persiste a vida inteira. Ele registra num caderno o nome de incontáveis mulheres, a quem se entrega de corpo, mas nunca de alma. Ao final do livro, Florentino e Fermina se reencontram para resolver a antiga história.
O que poderia ser apenas mais uma história de amor que sobrevive a obstáculos e ao tempo, nas mãos de Gabo se transforma numa obra mais saborosa a cada página. O belo de Fermina, Florentino e Urbino é que eles não são belos, são bastante comuns. Os homens, em especial, são até esquisitos, feios, sem atrativos, porém de alma encantadora, cada qual a seu modo. Florentino é sem sal, desajeitado e excêntrico. Urbino é um homem cheio de manias, teimoso, estranho, porém amoroso.
O amor de Fermina e Urbino é palpável, vivido dia a dia, com suas esquisitices, ranhetices e beleza. O amor de Fermina e Florentino fica no plano do imaginário, sustentado pela paciência e persistência (obsessão?) deste em esperar o momento de encontrar o caminho livre para o coração da amada. E é na concretização dessa paixão, que começou na juventude e sobrevive até a velhice, que somos presenteados com um retrato inigualável do que pode ser o amor entre seres de cabeça branca e alma juvenil.
O amor nos tempos do cólera é, na verdade, uma história sobre todos os amores de todos os tempos.

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