segunda-feira, 18 de abril de 2011

Um menino chamado Lobato.

Desde a publicação do primeiro livro, Urupês, em 1909, Monteiro Lobato fez parte da vida de várias gerações de brasileiros, que cresceram lendo suas histórias, especialmente as aventuras da impagável turma do Sítio do Pica-pau Amarelo. Cada um de nós, seus leitores, temos um personagem do coração: a espevitada e encrenqueira boneca de pano Emília que engoliu uma pílula e abriu “a torneirinha de asneiras”. A boa e sensata Vovó Benta que acolhia em seu sítio os netos, o corajoso Pedrinho e Lucia, a menina do Narizinho Arrebitado, que mais tarde tornou-se simplesmente “Narizinho”. A simplória e bonachona Tia Nastácia, que cuidava de todos com esmero e que, vira e mexe, era envolvida nas trapalhadas da garotada. O sábio Visconde de Sabugosa, a espiga de milho que falava feito adulto e tinha uma inteligência enciclopédica. E o roliço Rabicó, leitão que virou Marquês, graças a uma “invencionice” da Emília.
Com as histórias do Sítio do Pica Pau Amarelo, que começaram a ser publicadas na década de 20, Lobato pretendia criar aventuras com figuras bem brasileiras, recuperando costumes da roça e lendas do folclore nacional. Nas publicações seguintes, passou a misturar lendas brasileiras com elementos da literatura universal, mitologia grega, quadrinhos e cinema.
Saindo das páginas dos livros, a turma do Sítio ganhou vida na TV em diversas ocasiões, inspirando cinco séries: duas na TV Tupi, nos anos 50 e 60; uma na TV Cultura de São Paulo, em 1964, e as duas últimas pela Rede Globo. A primeira, entre 1977 e 1986, e a segunda, de 2001 a 2007.
Incluo-me nessa lista de leitores e telespectadores do Sítio. O primeiro contato com a obra de Lobato aconteceu aos 12 anos, por intermédio de meu padrinho Wellison, que me apresentou à coleção de livros que lera em sua infância, da Editora Saraiva. Fascinada, depois de pegar alguns emprestados, passei a comprar os meus próprios exemplares numa papelaria perto de casa (edições simples que guardo até hoje). Eram os anos 70. Maravilhada com as peripécias que eu via sair da mente daquele homem menino, acabei fabricando minha própria Emília de pano, com corpo laranja e vestido de bolinha. Feia como ela só.
Já naquela época, a vida num sítio, cercada de natureza e bichos e a linguagem rebuscada de Lobato não combinavam muito com a minha infância. Que dirá a dos meus filhos, em plena era da internet? Mas a obra desse escritor tão querido ajudou a despertar em mim o prazer pela leitura. E certamente assim o foi para milhares de brasileiros.
Há pouco tempo a obra desse aclamado autor começou a ser revisada - e criticada - sendo considerada racista a forma como tia Nastácia era retratada em suas histórias, particularmente em As Caçadas de Pedrinho.
Não pretendo julgar um homem que também era fruto de sua época e muito dessa época retratou. Prefiro lembrar aquele que foi o maior escritor infantil brasileiro de todos os tempos e que tanto nos deu em alegria, imaginação e sonho. O autor que, numa época em que os livros brasileiros eram editados em Paris ou Lisboa, passou a editar no Brasil, criando inovações nos livros didáticos e infantis. Que deixou obras como Urupês, Jeca Tatu, Reinações de Narizinho, Serões da Dona Benta e A Chave do Tamanho, só para citar alguns. O homem à frente de seu tempo que entrou de cabeça na Campanha do Petróleo, defendendo a exploração da nossa riqueza somente por empresas brasileiras. O visionário que dedicou sua vida e seu trabalho à luta pela preservação dos nossos valores culturais e riquezas naturais. E que foi pioneiro na defesa de nossas florestas, de nossos índios e de nossos bichos.
Deixemos que Emília, Narizinho, Tia Nastácia, Pedrinho, Dona Benta e cada personagem presente na obra de Monteiro Lobato prestem por nós, uma homenagem a esse menino que nasceu há 129 anos. E que deu a tantos brasileiros uma maravilhosa lembrança da infância.



José Bento Monteiro Lobato, nasceu em 18 de abril de 1882, em Taubaté (SP) e faleceu em 1948.

4 comentários:

  1. Olá Mari, muito linda sua homenagem a Montero Lobato. Nós que amamos livros e literatura devemos estar atentos às injustiças que, por ignorância, possa afetar a memória e a obra deste que tanto defendeu nossa liberdade e costumes.
    Beijos

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  2. Obrigada, Mônica. Que bom que sempre podemos compartilhar essas lembranças desse autor tão querido. Abraços.

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  3. Sensacional! Um autor que não só retratou os costumes e valores de sua época(e lembro que muito depois Lispector também escreveu coisas supostamente bastante racistas), e considerando a obra maior que a pequenez do possível problema(há três semanas estou a cozinhar no sol ardente tentando ser uma linda morena temperada pelo mar...)-e com algum sucesso chego a beleza dessa negritude que compõe as tantas cores de nossa história...Emília,eu era a Emília! Falastrona e desatrada que se deliciava com os quitutes fantásticos da outra vó que era chamada de Tia Nastácia!

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    1. Li quase tudo do Lobato, amiga. Os livros infantis, quero dizer. E foi encantador. Comecei por indicação do meu padrinho e depois acabei comprando um por um, baratinho, na Pralon (lembra disso?). Foram leituras maravilhosas que me marcaram muito. Pena que hoje a obra dele não seja "digerível" para as crianças nascidas pós-internet.

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